Caxias-MA 24/11/2024 08:35

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Sílvio Cunha

Caxias, Política e Sociedade

Uma vida em atraso por opção


De tempos em tempos o Maranhão é sacudido pela infortunada constatação de que é a unidade federativa mais pobre do país e seus frios indicativos econômicos e sociais confirmam isso. O observador de fora, o visitante, que passe por aqui, talvez se espante com esse tipo de notícia ao se ver diante de um estado repleto de riquezas naturais, água doce em abundância proveniente de seus rios, riachos e lagos, terras férteis para a agricultura e a pecuária e até uma grande floresta de babaçuais, de onde tudo se fala de melhor em matéria de economia sustentável, mas que, no entanto, ainda é inaproveitada e mesmo tratada como estorvo por quem devia sabiamente explorá-la.

Atirada ao limbo das oportunidades perdidas ao longo de décadas, agora o maranhense se chateia quando ouve alguém dizer que ele é um grande preguiçoso, que não gosta de trabalhar, e que é por isso que o estado nunca se desenvolveu como deveria. Estudante na década de 1970 no Ceará, ficava surpreso quando ouvia amigos me dizerem que gostariam muito de ter as terras que têm o Maranhão, pois se as tivessem, os rincões de Martim Soares Moreno, de José de Alencar, de padre Cícero Romão Batista, com certeza não seriam apenas as terras mais progressistas do nordeste brasileiro, mas um lugar que incomodaria em pujança até o rico e industrializado Estado de São Paulo.

Agora, quando vemos a chegada da cultura da soja ao Maranhão, com o cenário já alcançando Caxias, é que percebemos o quanto deixamos para trás de oportunidades perdidas, a começar pela nossa classe trabalhadora que não teve o direito de se educar para razoavelmente poder se atirar às labutas produtivas que a economia exige. 

Pressentindo o perigo de ficar à reboque de quem tem maior poder de decisão, investidores de fora, as autoridades maranhenses correm para tentar preencher as muitas lacunas existentes da melhor forma possível, através da criação de pólos educacionais públicos e privados por todo o território. 

A expectativa é não permitir que a nossa juventude fique alijada dos muitos investimentos que estão chegando e que vão crescer e gerar milhares de empregos, dentre outros, a partir da instalação e funcionamento da estrada de ferro de mais de 500 quilômetros que interligará a cidade de Açailândia à centenária cidade monumento de Alcântara, onde será estabelecido um grande porto de exportação e retomado o funcionamento da mais econômica base de lançamento de foguetes que existe no mundo, com alta capacidade de gerar grandes ativos comerciais.

Olhando-se para o que se passa, é impressionante constatarmos a inércia e a subserviência que sempre imperaram no seio da elite dirigente do país desde a colonização portuguesa, uma herança que foi deixada e tratada com muito capricho por aqui ao longo de décadas, cerca de dois séculos, e que é responsável pelo marasmo que se apossou da sociedade maranhense, fazendo que muitas pessoas pensem que apenas um pequeno grupo tem direito a possuir tudo e que os demais devam viver de migalhas, em injustificado confronto com o que reza a doutrina capitalista.

Segundo o capitalismo, a geração de empregos, a circulação de dinheiro, gera mais dinheiro e faz expandir toda a sorte de investimentos, proporcionando uma vida mais estável no meio social. Não é de admirar que as ruas brasileiras, as caxienses, estejam hoje cheias de pedintes, de mendigos e de drogados que, por ignorância e em grande vulnerabilidade social, são atraídos para o insidioso caminho do narcotráfico. 

Por outro lado, o fator insegurança geral emerge também desse caldo de cultura, deixando as residências, os comércios, mais parecidos do que nunca com as instalações das casas de custódia espalhadas pelo país afora. E, para piorar, procuram-se desculpas em ideologias, como se suas representações, só pelo fato de se falar, fossem capazes de por termo a todas as dificuldades ora existentes em nossa sociedade.

Através do ensaio de um doutorando capixaba sobre a economia caxiense, tomei ciência do que nossas elites foram capazes de fazer contra o processo de industrialização do Maranhão, a partir da segunda metade do século 19. Por coincidência, mais ou menos na mesma época em que os Estados Unidos da América se lançaram a uma guerra fratricida que ceifou mais de 600 mil de vidas, pela disputa do estilo de vida que aquele país iria ter após o desfecho sangrento, e quando também São Paulo começou a instalar o maior parque industrial brasileiro.

Todo nativo daqui sabe que Caxias já foi denominada de Manchester Brasileira, em alusão à grande cidade do Reino Unido Britânico famosa por suas fábricas na época da primeira revolução industrial. Pois bem, as fábricas de tecidos que funcionaram em Caxias no período do ciclo do algodão, simplesmente foram relegadas e deixadas à margem dos avanços tecnológicos para não prosperarem porque os políticos maranhenses de então, aliados aos coronéis donos de terras no sertão, acharam-se ameaçados pela política de empregos que estava crescendo no meio fabril, baseada no pagamento de salários e outros benefícios aos trabalhadores, os quais, para eles, eram um choque ao seu modo de vida baseado na escravidão.

Assim, em meados dos anos 1950, já não havia mais nenhuma fábrica funcionando em Caxias, os donos fecharam suas portas e foram morar longe do município, deixando as grandes edificações como exemplo da massa falida que foi sepultada pelo capricho de uma visão equivocada de preservar o poder e ganhar dinheiro, em detrimento do progresso da cidade e de seus cidadãos.

Em fins dos anos 1960 e começo da década de 1970, outro exemplo dessa visão equivocada adveio com o impedimento do saudoso empresário paraibano João Claudino instalar o seu grupo empresarial na cidade, de onde ele imaginava iria se expandir para todo o Maranhão e nordeste brasileiro. Sentindo-se rejeitado, foi sentar praça no vizinho Piauí, onde se consolidou a partir da capital, Teresina, oportunizando grande número de empregos, muitos que poderiam ter ficado por aqui oxigenando a economia caxiense e elevando a importância do município no cenário estadual para além do tratamento que lhe é dispensado como terra dos poetas, dos literatos e dos intelectuais com renome nacional e internacional.

E pensar que Sobral, no Ceará, que até à altura dos anos 1970, era do porte de Caxias, e há pouco se tornou maior até do que Imperatriz, hoje a maior cidade do interior maranhense, apenas porque teve o seu parque industrial reforçado com a chegada de um grande empreendimento do sul do país, que favoreceu a geração de milhares de empregos diretos e indiretos naquela região. 

Lá não aconteceu somente a ampliação do mercado de trabalho. A decisão conduziu os sobralenses também a outro patamar de infraestrutura de cidade, de comércio, de saúde e de educação, este último através do aporte de mais universidades públicas e privadas, e também como polo modelo exemplar de ensino público no país.

Assim, se estamos nessa difícil batalha por desenvolver Caxias nos dias atuais, torná-la menos depende da geração de empregos diretos e diretos proporcionados pela gestão municipal, que é, indubitavelmente, a maior empresa empregadora do município, devemos tudo à falta de visão dos que pensaram apenas em preservar seus privilégios, sem atentar para a vida das futuras gerações. 

Não foi à toa que o Barão de Mauá, o grande empresário/financista Irineu Evangelista de Sousa, nunca conseguiu conversar direito com o imperador Dom Pedro II, em suas investidas para sensibilizar o monarca em direção à grande liderança que ele achava que o Brasil deveria ter na América Latina, por ser proprietário de riquezas inigualáveis em diversidade e quantidade jamais encontradas já naquela época. 

É que fazendo o jogo dos mais poderosos de então, no caso, os grandes banqueiros ingleses, muitos assessores do império se venderam, para garantir suas polpudas rendas e manter o país em regime econômico embasado na escravidão. Aqui não houve coisa parecida, apenas o medo de pretensamente dividir os privilégios alcançados no poder político. Talvez, sem querer, houve uma decisão de viver atrasado por opção.


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