Caxias-MA 24/11/2024 08:30

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Sílvio Cunha

Caxias, Política e Sociedade

Patrimônio decadente


Há dois domingos, cedo da manhã, tive a oportunidade de conhecer um pouco a cidade de Viana, aqui no Maranhão, localizada na Baixada Maranhense, pelas lentes da TV Mirante, através do seu excelente programa Repórter Mirante.

A reportagem explorou as belezas naturais daquela região, destacando, óbvio, o monumental lago de Viana, a sua produção de pescados ainda colhida de forma artesanal, mas sem esquecer de evidenciar com mais profundidade o que os vianenses planejam fazer para dotar o local de uma infraestrutura moderna para o lazer e o turismo, que em pouco tempo, sem dúvida, incrementará mais a economia na área, oferecendo uma renda melhor para os investidores e mais empregos diretos e indiretos para a população.

Além disso, tive a curiosidade aguçada para a parte velha da centenária cidade e pude constatar que a grande maioria do seu casario do século 19 está intacta, ou ainda em condições de ser recuperada, o que por certo será mais um atrativo ao visitante interessado em conhecer o passado da gente maranhense, além do que atualmente ainda pode ser vislumbrado em São Luís ou em Alcântara.

O leitor certamente percebeu que não citei a Princesa do Sertão Maranhense que, apesar de bicentenária, pouco hoje tem a oferecer a quem vem por aqui conferir referências históricas, mas certamente se surpreende com o estado de abandono em que se encontra o velho casario de inspiração portuguesa que iluminou a mente dos grandes vates da terra e que fez Caxias ser denominada também como Cidade dos Poetas.

A verdade é que pouco a pouco, dia após dia, Caxias vem perdendo a sua identidade de cidade histórica. Os que nasceram aqui, mas residem fora, com mais de 50 anos, com certeza terão dificuldade de entender como não é mais possível passear à noite pela praça Gonçalves Dias, pela praça da Matriz, mesmo pela praça Dias Carneiro - conhecida também como praça do Pantheon Caxiense, que é mais recente -, tal o abandono a que estão relegados esses e outros logradouros públicos do centro da cidade. 

Se no passado os empreendedores fizeram questão de marcar suas presenças em solo gonçalvino edificando belas moradas, hoje o retrato do descaso está estampado nas ruínas da antiga sede do clube Casino Caxiense, na rua Aarão Reis, e na decadência da mansão Delfinlândia, na rua 1º de Agosto, ambos habitados por moradores de rua, viciados em drogas, só para deixar a coisa ficar em  dois exemplos do nível baixo em que se encontra o patrimônio histórico da cidade, apesar de inscrito nos anais de preservação permanente da nação.

Não sei se por razões de modismo, insegurança, expansão desordenada do comércio, ou falta de investimentos em calçadas e passeios públicos, mas um fato chama a atenção de qualquer visitante: o centro de Caxias não reúne mais as moradias das famílias de outrora. E assim, durante a semana, no horário comercial, assiste-se a movimentação intensa de veículos e de pessoas. À noite, porém, o centro se transforma num local fantasma, onde só bichos,  moradores sem teto perambulam com mais desenvoltura, e não por acaso vez por outra surgem as notícias de assaltos a incautos transeuntes e arrombamentos de lojas.

Desfigurados por placas publicitárias e arrendados aos comerciantes dos tempos modernos, os velhos casarões de Caxias agonizam esquecidos da sua importância e esplendor. Louvável foi a parceria do Governo do Maranhão com a Prefeitura de Caxias, que recentemente permitiu a recuperação do prédio da União Artística Operária Caxiense, situado na praça Dias Carneiro, para que nele viesse a ser instalado um investimento social de grande monta, que é o Restaurante Popular Deputado Zé Gentil, ora em pleno funcionamento e atendendo especialmente pessoas em condições de vulnerabilidade social.

Contudo, do outro lado da praça, encontra-se o majestoso prédio da antiga fábrica da Companhia da União Têxtil Caxiense, também chamada Manufatora, inaugurada em 1889,  símbolo maior de uma época de pujança da economia caxiense, em situação delicada à apreciação dos visitantes. Em seu interior existe plena atividade, e a Secretaria Municipal de Cultura, assim como a de Educação, o Departamento Tributário, a Escola de Música, dentre outros órgãos da prefeitura, dão vida ao local onde antes funcionava o parque de tecelagens e confecção de tecidos de algodão na antiga fábrica. 

O problema é maior do lado de fora, porque o entorno do prédio, inexplicavelmente sem proteção alguma, foi invadido por vendedores ambulantes de comidas produzidas ao ar livre, ponto de estacionamento de ônibus que fazem linha para povoações da zona rural, comerciantes de frutas e de tudo mais que apareça para ser ofertado às pessoas que passam pelo logradouro. O resultado de tal miscelânea é que no local ocorre de tudo, inclusive serventia de latrinas para aliviar a quem estiver em necessidade fisiológica. Em função disso, o que temos de belo para mostrar causa, ao mesmo tempo, repugnância e temor de apanhar alguma doença, pela sujeira que impera em toda a área.

De nada serve propagar que a cidade ganhou novas atrações turísticas, uma verdade, se a riqueza do passado histórico vao ficando abandonadas. O casarão que servia de escritório da companhia têxtil Chames Aboud, que chegou a ganhar o status de sede da Secretaria Municipal de Saúde, agoniza na segunda metade da rua Aarão Reis, que já  perdeu o magnífico sobrado neo-colonial onde funcionou a escola João Lisboa, demolido para servir de estacionamento de veículos a uma agência bancária. 

É verdade que até no entorno da praça Gonçalves Dias diversos prédios históricos foram demolidos ou estão descaracterizados. O Grupo Escolar Gonçalves Dias, edificado sob os alicerces de antigos casarões que circundavam o largo do poço, como se chamava o logradouro antes da  inauguração da praça em 1923, e que já foi o fórum judicial e agora abriga a Procuradoria Geral do Município, apresenta visual deteriorado. Próximo dali, na antiga rua do Cisco, já não existe mais a bela morada inteira do saudoso empresário Turíbio Oliveira, e pelo menos dois outros casarões em frente à residência do saudoso comerciante José Simão, caminham para o mesmo destino.

A decadência, como uma praga, parece ir tomando conta do centro de Caxias. Alguns investidores de fora que têm instalado novos empreendimentos, quando solicitados, até procuram manter a fachada original desses casarões, o que não deixa de ser um alento para os olhos. Mas ninguém entende porque as velhas fiações telefônicas nos postes das ruas ameaçem cair sobre a cabeça dos transeuntes, tamanho o desleixo das empresas que as instalaram, as quais nem se preocupam nem dão satisfação alguma sobre o por quê das excrecências ainda não terem sido eliminadas, para recomporem o visual da cidade.

Quem chega por aqui tem a certeza de que não há fiscalização para nada. Até nisso as ruas centrais da cidade incorporam a triste situação, e não é somente através dos pisos deteriorados, também as calçadas desordenadas dificultam a circulação pela cidade, já que ninguém respeita o código de posturas do município, nem mesmo os administradores pagos para fiscalizar o cumprimento de suas normas.

Talvez o assunto venha à baila quando da atualização do Plano Diretor de Caxias, trabalho que já está em andamento na Câmara Municipal. Aliás, o legislativo caxiense já se prepara para promover uma sucessão de audiências públicas, tendo em vista resolver demandas da população. É certo que haverá espaço para as causas sociais, mas com toda a certeza haverá momentos para se discutir o patrimônio histórico, até porque é ele que dá identidade maior à cidade e ao município.

A decadência do patrimônio da cidade também está relacionada aos surtos de endemias que chegam a Caxias, principalmente na estação das chuvas. E o maior alerta para o fato foi dado recentemente por uma autoridade no assunto, o servidor decano do serviço de endemias do município, Natanael dos Reis, ao revelar, quase pedindo socorro, que alguma providência seja tomada em relação à grande piscina do abandonado Clube Alecrim, ora transformada num gigantesco berçário para bilhões de mosquitos, que de lá voarão para infestar, ao sabor dos ventos, toda a cidade, propagando doenças perigosas como dengue, zika e chikungunya.

Mas vamos ser otimistas. Afinal, estamos em pleno ano eleitoral, e por causa dele talvez algumas obras boas resultem para melhorar o visual de Caxias. A praça Vespasiano Ramos acaba de ser revitalizada para receber neste domingo, 1º de maio,  novamente a Feirinha da Cidade, inativa durante os dois últimos anos por causa da pandemia.

No Dia do Trabalhador, um evento esportivo de arromba é aguardado no Estádio Duque de Caxias que, em função disso, teve muros reparados e pintados, área de entorno capinada, gramado do campo de futebol caprichado e a sua praça de entrada revigorada, inclusive recebendo modernas lâmpadas de led para o seu sistema de iluminação. 

À falta de um melhor planejamento e decisão política maior, fiquemos por enquanto com uma tradição por cá que já vem de longe: tempo de eleição sempre garante melhorias para Caxias.


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