Preferência
Do amor que a causa da intenção; para que ele exista em mim e em ti...
do ódio não quero a intenção da causa; para que ele desista de nós...!
Ceticismo e crença
Eis a questão!
sal, ao pão, para a existência da matéria
doce, ao vinho, para a vida eterna do espírito.
aleluia à fé...
Traição recíproca
Se o afã insidiou
e não somos um só ser
eu não sou você
e você não é eu
então,
traí a mim mesmo
ao ser traído por ti
e, sem nós dois,
o que resta
é a ausência do que não fomos presente
ao que queríamos ser.
Chuva
Lágrimas caídas de um imenso olho azul
que, momentaneamente, escurece
para derramar seu pranto
no rosto da terra.
A/amar/morto
Meu coração está vazio...
antes, cárcere abrigo às paixões utópicas.
agora, oceano inabitado à nau sem âncora
e sob naufrágio em vendaval interminável.
eis que, imerso num mar de ilusões, não pacífico,
afogado está meu corpo à água e ao sal...
enfim, minha alma surge de um fel continental.
Eu
Preso às circunstâncias grupais
escravizo-me em inúteis fugas
alheias à unicidade.
sem encontrar abrigo individual
multiplico as buscas pelo zero
à esquerda de mim.
Os poetas
Andarilhos sob um mesmo calvário.
anjos ou demônios terráqueos.
pretensiosos, querem adivinhar
a cor da ambiência celestial ou infernal.
inépcia, é a conclusão desse poema escrito.
Ônus do haver
Não haverá diferença
- que de um tudo unânime consistisse;
não haveria erro
- que o encanto acidentasse o fato;
não haveria causa
- que a intenção içasse a atitude;
não haveria consequência
- que a realização autodeterminasse a virtude;
não haveria destino
- que o desejo mostrasse o caminho;
não haveria perda
- que a mutação fosse contínua;
não haveria fim
- que o viver insidiasse o desaparecimento.
Prazer inicial
A carne
– todavia –
afronta-se com o desejo que arde em si.
o espírito
– contudo –
inibe-se baldado pelo posseiro ato.
embora,
líquido dessa carne banhe a minha vergonha,
esse espírito, também meu,
alado num álibi,
voa no espaço que há entre ambos.
Báratro dos bêbados
Canto transparente da solidão:
lugar meio séptico,
há homens torturados sob falsa alegria,
copos cheios de ativa verdade,
goles de puro ceticismo,
embriaguez da mágoa,
limpa ausência da razão,
retrato do banal domínio,
uma cópia da fuga existencial.
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